Alvo de uma decisão inédita da Comissão de Ética da Presidência da República, que recomendou ao Palácio do Planalto sua demissão por violação de conduta, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, resistiu mais um tempo no cargo. A duras penas. Convocado pela presidenta Dilma Rousseff a explicar as novas denúncias de duplo emprego, Lupi pediu prazo para provar inocência. Mas sua validade está se esgotando. Esperava-se que ele caísse, porém Dilma contrariou as expectativas, surpreendendo a oposição, o PT e outros partidos da base aliada, que não foram poupados em episódios anteriores. Enquanto outros seis ministros tombaram, Lupi ganha sobrevida, embora pesem contra ele acusações graves (leia o quadro). Desde agosto, ISTOÉ vem denunciando a cobrança de propina na Secretaria de Relações do Trabalho para a liberação de cartas sindicais. Agora se sabe que Lupi, acusado de acumular ilegalmente salários da Câmara dos Deputados e do gabinete de um vereador, também recebia como funcionário da Prefeitura do Rio de Janeiro. ISTOÉ teve acesso a seus contracheques, o último deles, inclusive, é de março de 2007 – mês em que assumiu a função de ministro de Estado.
A pergunta que se faz em Brasília: é o que segurou Lupi no cargo? A resposta envolve questões concretas e outras abstratas, até emocionais. É o caso, por exemplo, do afeto que Dilma conserva pelo PDT, legenda em que iniciou sua trajetória política levada pelas mãos do ex-marido Carlos Paixão Araújo, até hoje ligado ao partido fundado por Brizola. A presidenta, que se refere ao ministro do Trabalho como “Lupinho”, também tem levado em conta pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de esperar até a reforma ministerial de janeiro para fazer novas demissões. E aí entram questões práticas. Além de não ter encontrado um nome adequado para substituir Lupi, mantendo a pasta nas mãos do PDT, Dilma tem no ministro um aliado fiel e poderoso. Influente no partido, do qual é presidente de fato, ele controla ao menos 75% da bancada pedetista na Câmara e age rapidamente quando há uma ameaça de rebelião. Foi assim na votação do salário mínimo, em fevereiro, quando a bancada prometia votar contra o valor de R$ 545 definido pelo governo. Lupi foi convocado pelo Planalto e conseguiu que 19 dos 26 parlamentares seguissem sua orientação. Há duas semanas, o ministro atendeu novamente aos apelos palacianos e telefonou para todos os deputados do PDT pedindo que aprovassem a prorrogação da DRU (Desvinculação de Receitas da União). Conseguiu 24 votos e foi elogiado. “Não é por acaso que a presidenta vem mantendo ele no cargo”, admite o líder do PDT, deputado Giovanni Queiroz (PA).
O cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília, avalia que demitir Lupi agora, sem substituí-lo por outro pedetista, criaria atrito com o PDT. Ele lembra que a exoneração em julho do ministro dos Transportes, senador Alfredo Nascimento, provocou um profundo desgaste com o PR. A sigla, presidida por Nascimento, quase rachou de vez com o Palácio do Planalto e até hoje ameaça abandonar a base governista. “Dilma não pode se dar ao luxo de perder os votos do PDT”, afirma Fleischer. Não estão em jogo apenas as votações no Congresso, mas o apoio para as eleições municipais de 2012. O PDT tem ascendência no movimento sindical, que se uniu para defender o ministro. Além de promover uma multiplicação de entidades em seu mandato, Lupi fortaleceu as centrais sindicais. “Já estamos no fim do ano e a presidenta está vendo que não vale a pena se desgastar com o PDT como ocorreu com o PR”, reforça o deputado Luciano Castro (PR-RR).
De certa maneira, a presidenta também não quer ter suas ações pautadas pela mídia, de onde tem vindo a maior parte das denúncias de corrupção contra integrantes de seu governo. Dilma apoia o papel de fiscalização da imprensa, mas não quer dar a impressão de que herdou de Lula uma espécie de governo amaldiçoado, infestado de corruptos – como quer a oposição. Por isso, ela preferiu segurar Lupi e o ministro das Cidades, Mário Negromonte (PP), ao menos até janeiro. Na reforma ministerial, a presidenta pensa em eliminar secretarias especiais e ministérios nanicos, como o da Pesca e Aquicultura, e até reunificar as pastas do Trabalho e da Previdência.
Dilma também ficou irritada com o vazamento para a imprensa da decisão da Comissão de Ética antes mesmo que o parecer chegasse à sua mesa. O documento, de apenas dez linhas, foi considerado “sucinto demais” pela presidenta. Mas não foi a primeira vez que o ministro se viu censurado pelo órgão. Em 2007, os conselheiros sugeriram sua demissão, alegando irregularidades no acúmulo do cargo de ministro com o de presidente do PDT. Depois de muita polêmica, Lupi se licenciou, mas manteve-se no comando de fato do partido. Teve o apoio do presidente Lula. E, desta vez, Dilma também optou por não dar ouvidos à comissão. “Quem decide sobre demissão de ministro sou eu”, disse a presidenta. Lupi ganhou tempo. Mas, segundo fontes do Planalto, o ministro dificilmente passará desta semana. O ideal para a presidenta seria que ele pedisse demissão. Seja como for, o ex- jornaleiro que ainda manda no PDT já é uma página virada.
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