Em parte, têm razão. Agem como os colonizadores portugueses em relação ao Brasil, sugando todas as nossas riquezas sem a menor preocupação de ao menos nos tapear com as migalhas que por ventura caia da mesa de banquete, tudo com nossa permissão histórica. A exemplo do que fez o reino de Portugal, a cada dia querem levar “nosso ouro” com toda a volúpia, sem nos conceder o direito de usufruir de parte das riquezas aqui produzidas.
Aqui, nos acostumamos a abrir mão dos nossos direitos, de nossa soberania em troca de simples miçangas, espelhinhos e outras bugigangas. Sempre nos bastou o sorriso fácil dos soteropolitanos ou de interioranos emergentes para consideramos nossos amigos, nossos protetores na capital do estado. A cada governo – não importando o partido –, as promessas eram repetidas e enriquecidas com novas, talhadas para não serem cumpridas.
De início, abrimos mão do poder político, entregando-o, de mãos beijadas, às pessoas ditas mais preparadas e de fácil trânsito junto ao governador, presidente da República, senadores e deputados. Claro, já detínhamos o poder econômico, precisávamos plantar e cuidar das nossas roças de cacau, enriquecer mais. Nosso compromisso era comprar sobrados e apartamentos no “Corredor da Vitória”, em Salvador; em Copacabana, no Rio de Janeiro; então capital federal, mandar os filhos estudarem para ser doutor.
Aqui, ricos como éramos, dispensávamos o poder do Estado para implantar a infraestrutura e investíamos na implantação da eletricidade – no campo e na cidade –, e cansados com pachorrenta viagem no trem de ferro, criamos uma empresa de sociedade anônima, a “Companhia Viação Sul Baiano S.A”, para construir a estrada Ilhéus-Itabuna e viajar de ônibus, as modernas marinetes que tanto sucesso faziam nas capitais brasileiras.
Mas passamos por períodos de dificuldades em nossa maior matriz econômica, a cacauicultura, atividade por demais rendosa, que com a mesma facilidade que produzia riqueza e “coronéis”, proporcionava a pobreza de consciência e a submissão aos mais poderosos. Àquela época, nos sentíamos orgulhosos de, com o dinheiro dos impostos do cacau, uma atividade econômica primária por excelência, financiarmos o parque industrial de São Paulo.
Se as riquezas aqui produzidas eram utilizadas em nível federal, gerando divisas internas e externas, dentro da Bahia reinávamos absolutos na arrecadação de impostos, agindo como a maior região contribuinte para o erário estadual. E os registros históricos demonstram que a máquina arrecadadora do Estado se preocupava apenas com os meses subsequentes à colheita da safra principal e temporã.
Até os dias de hoje, o ex-governador da Bahia, Antônio Lomanto Júnior, repete à exaustão a comodidade do Estado em pagar seus compromissos com fornecedores e a folha de pagamento dos servidores estaduais. Se àquela época a economia sul-baiana era vital para a saúde financeira do Estado, em tempos mais recentes foi determinante para a implantação do Complexo Petroquímico do Nordeste (Copene) e do Complexo Petroquímico de Camaçari (Copec), introduzindo a Bahia no rol dos estados industrializados.
As dificuldades sazonais da cacauicultura voltaram, desta vez agravada com a vassoura-de-bruxa, fungo que praticamente dizimou os cacaueiros de nossa região. É verdade, empobrecemos, ficamos sem o poder econômico e sequer lutamos para participar ou tomar o poder político. Contentamo-nos em continuar esmolar nos gabinetes do governo do estado, recebendo promessas nunca cumpridas.
Como ressaltou em seu discurso, o vereador Paulo Carqueija, essa cobrança lhe “doía na carne, lhe fazia sangrar”, por ter que fazer esse tipo de cobrança a um governador do seu partido. E justificou: “Não me sentiria bem, pois esse não é do meu perfil, cobrar a mudança da prática política reinante neste país há 500 anos, escondendo o que se passa dentro da minha casa.”
E o vereador ainda ressaltou a contumácia de omissão do governador, pois seria a segunda vez que utiliza a tribuna da Câmara para reclamar as providências para Ilhéus. Com humildade (atributo incomum nos políticos) Carqueija diz que sua reclamação não é nenhum arroubo político para mostrar serviço aos conterrâneos, mas, sobretudo, ser um porta-voz da comunidade que me elegeu. E por certo continuará a proferir esses discursos e o governador fazendo ouvidos de mercador para eles.
Não por falta de recursos, pois eles existem nos cofres do Estado, entretanto, as prioridades são outras, sempre eleitas de acordo com as conveniências eleitoreiras. Para o Sul da Bahia bastam as promessas, que se repetem a cada eleição, com peças publicitárias no rádio, televisão, sites, jornais e revistas, com musiquinhas animadas e depoimentos feitos por pessoas devidamente treinadas pelas agências de propaganda do governo.
Os recursos existem, sim, basta uma simples verificação no Orçamento da União. Somente para o ano de 2012 serão mais de R$ 9,8 bilhões destinados à Bahia, valor que poderá ser incrementado após as emendas parlamentares. Mas todas essas verbas – federais e estaduais – têm destino carimbado: outras regiões do estado, as que possuem políticos compromissados e que se unem, independente da base partidária, quando o assunto é a aplicação de investimentos, ao contrário de nossos parlamentares, que se notabilizam por “colocar uma pedra em cima dos projetos”.
E por todas essas idiossincrasias das autoridades que governam nosso estado – sempre comprometidas com a Bahia do Norte, do Sudoeste, do Oeste, do Recôncavo, menos do Sul – é que aparecem frequentemente ideias e projetos de divisão do estado da Bahia. Ideias essas que são rechaçadas com veemência pelas autoridades e meios de comunicação da capital, com a ajuda de artistas famosos das mais diversas formas de expressão. Como sempre, o colonizador defendendo manter o seu direito de espoliar o colonizado.
No Sul da Bahia a proposta de divisão da Bahia, com a consequente criação de um estado abrangendo as regiões Sul, Extremo Sul, Baixo Sul e parte do Sudeste ganha corpo, embora ainda tenha o comportamento de “fogo de monturo”. Não demorará que uma campanha capitaneada pelas autoridades do governo do estado comece a tentar desconstruir a ideia e seus autores, a exemplo da passada, quando diziam ser impossível separar Gilberto, de Gil; Caetano, de Veloso; Maria, de Bethânia.
Ora, a separação é uma ação e atitude inerente à vida humana, seja ela na família, entre os amigos, colegas de trabalho, dentre outras formas de agrupamento. Nem por isso uma família é desfeita quando o filho sai de casa e vai morar fora, buscar sua independência. No caso do Sul da Bahia, o argumento é ainda mais justo e convincente, tendo em vista o abandono a que essa região é submetida pelos sucessivos governos, das mais diferentes ideologias (quando ainda existiam).
Para finalizar, deixo aqui um trecho do discurso pronunciado em 1870 por Joaquim Nabuco, no início da sessão legislativa, comentando o discurso do Governo Imperial sobre a escravidão. “A omissão trai uma deficiência política do governo e revela uma postura de irresolução, hesitação, e de evitar o enfrentamento dos graves problemas do presente, jogando-os para um futuro vago e indeterminado”.
O passar dos anos não foi suficiente para mudar o comportamento dos políticos. Infelizmente.
Walmir Rosário é advogado, jornalista e editor do site www.ciadanoticia.com.br
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