A recente valorização do dólar e do yuan reduz um pouco da tensão em torno da chamada guerra cambial e torna menos provável o uso de novos controles de capitais pelas economias emergentes. Mas ainda é bastante incerto quando países como Brasil, África do Sul e Coreia vão derrubar defesas contra os fortes ingressos de dólares criadas nos últimos anos.
Cálculos do Peterson Institute for International Economics, um centro de estudos de Washington, mostram que a sobrevalorização do dólar perante moedas do resto do mundo aumentou de 8,5% para 9,3% entre abril e outubro, em virtude da migração dos investidores para ativos mais seguros nos Estados Unidos após o agravamento da crise europeia.
Na direção inversa, a sobrevalorização do real diminuiu de 10,1% para 5,2% no período. Moedas de outros países que adotaram controles de capital também se depreciaram.
O dólar ficou mais forte a despeito de o Fed (Federal Reserve, o banco central americano) ter anunciado recentemente um novo plano de relaxamento monetário, a chamada "operação twist". Países emergentes, sobretudo o Brasil, vinham acusando os Estados Unidos de alimentar a guerra cambial por meio de emissões monetárias que desvalorizam o dólar.
O yuan também se fortaleceu nos últimos meses, ainda que não o suficiente para corrigir completamente seu alto grau de subvalorização. Essa é a outra frente da guerra cambial. Países como o Brasil e os Estados Unidos acusam a China de manipular o câmbio para favorecer as exportações. Em outubro, a moeda chinesa estava sobrevalorizada em 10,6%, ante 16% em abril, segundo cálculos do Peterson Institute.
"Não temos mais o mesmo tipo de guerra cambial que vimos no passado, se é que temos qualquer tipo de guerra cambial no momento", disse ao Valor William Cline, pesquisador sênior do Peterson Institute.
O fortalecimento do yuan é resultado da política de gradual valorização adotada por Pequim em meados no ano passado, que vem sendo potencializada pela inflação relativamente alta do país. A valorização do dólar também ajudou a apreciar o yuan em relação a moedas de outros países emergentes, já que o câmbio chinês é atrelado à moeda americana.
Estimativas sobre valorização cambial estão sempre sujeitas a controvérsia, pois chega-se a valores diferentes dependendo do critério adotado. O Peterson Institute usa como parâmetro as previsões do FMI para o saldo em conta corrente de cada país. Saldos positivos muito grandes indicam subvalorização.
O saldo em conta corrente chinês caiu a 3% do Produto Interno Bruto (PIB) nos três primeiros trimestres deste ano. É uma forte correção em relação ao superávit de 10,1% do PIB de 2007, ou mesmo os 5,2% do PIB de 2010. Reportagem do jornal "Wall Street Jornal" desta semana nota que, nesse patamar, o superávit chinês está abaixo do teto de 4% do PIB que os Estados Unidos queriam impor para a China dentro das discussões do G-20, o grupo das 20 nações mais ricas do mundo, sobre valorização cambial no ano passado.
Vítimas da guerra cambial, países emergentes impuseram controles de capitais para tentar evitar a valorização excessiva de suas moedas. A trajetória de suas taxas de câmbio mudou de direção nos últimos meses, graças ao fortalecimento do dólar e do yuan. Mas a depreciação cambial ainda parece insuficiente para encorajar esses países a levantar os controles cambiais adotados nos últimos anos.
O estudo do Peterson Institute inclui seis economias emergentes que, segundo levantamento recente do FMI, destacaram-se no uso de controles de capitais. Desse grupo, pelo menos três (Brasil, Turquia e África do Sul) seguem com moedas sobrevalorizadas. Em outras três economias (Indonésia, Coreia e Tailândia), as taxas de câmbio estão em equilíbrio, ou seja, não estão valorizadas ou subvalorizadas.
Outra questão é se a apreciação do dólar vai durar muito tempo. Se ela for apenas temporária, os países emergentes estarão menos inclinados a remover controles de capitais. Se a situação na Europa melhorar, os fluxos de capitais aos países emergentes tendem a se recuperar. Há também o risco de os países desenvolvidos promoverem expansão monetária adicional para evitar uma maior desaceleração econômica.
Recentemente, Japão e Suíça, também tidos como porto seguro para os capitais em meio à crise europeia, intensificaram as intervenções cambiais para conter a apreciação de suas moedas. Muitos veem esse movimento como um novo desdobramento da guerra cambial. O Peterson Institute mostra que a estratégia de defesa pode ser justificada no caso do Japão, que tinha uma moeda sobrevalorizada em 9% em fins de outubro. Mas não no caso da Suíça, cuja moeda está subvalorizada em 6,1%.
Nenhum comentário:
Postar um comentário