A triste trajetória de ex-funkeiros que trocaram a fama pelo crime
Quanto maior a altura, maior a queda. No mundo do funk, a máxima costuma transformar, da noite para o dia, um MC famoso em ‘só mais um Silva’. A prisão de William Santos de Souza, o William do Borel, 40, segunda-feira, reabriu o debate sobre carreiras pouco duradouras no gênero musical. Sucesso na década de 90 ao lado do MC Duda, ele foi flagrado no estado do Paraná, trazendo 13 kg de maconha para o Rio. Para especialistas das áreas artística, médica e social, o declínio está ligado à falta de estrutura familiar e a maus exemplos. A explicação para o rápido declínio, da fama ao anonimato, e, às vezes, ao envolvimento com o crime, tem relação com os ensinamentos recebidos na infância, segundo psiquiatras. “Se o jovem não aprende a administrar, perde o dinheiro e recorre à fórmula mais fácil que conhece”, enfatiza o psiquiatra e psicanalista Luiz Alberto Py. Membro da Associação Brasileira de Psiquiatria, Fábio Barbirato acredita que os maus exemplos prejudicam. “Todos precisam de um modelo para reforçar as atitudes. Sem limites, você quer tudo o que nunca teve”.
Para o professor de Comunicação Social e autor do livro ‘O Funk e o Hip Hop invadem a cena’, meios de auxílio a novos talentos podem ser criados, como associações com trabalhos de formação e orientações. “Muitas vezes, o empresário dá a chance, mas se, der certo, ele fica com a maior parte dos lucros. Isso funciona na informalidade, já que os meninos não têm conhecimento”, analisa Micael Herschmann. Em 2008, o Instituto de Pesquisas da Fundação Getúlio Vargas revelou que o funk carioca movimentava, ao mês, cerca de R$ 10,607 milhões, total de R$ 127,285 milhões ao ano. Hoje, a verba deve ser maior diante da ‘inflação’ dos cachês. Um MC pode faturar de R$ 50 mil a R$ 200 mil por mês, sendo até R$ 15 mil em uma apresentação. “O cantor pode conciliar três shows na noite”, diz Rômulo Costa, dono da equipe Furacão 2000. Produtores e empresários, dispostos a prolongar sucessos no mundo da música, mudaram a maneira de tratar jovens. Além de exigirem profissionalismo e comprometimento, aconselham os pretendentes — quase dois mil estão na ‘porta’ do mercado — a não abandonarem o antigo emprego ou o estudo até a carreira se estabilizar. Dos que esperam uma chance, menos de 5% conseguirão emplacar uma música. “É alta a rotatividade por termos muitos artistas de uma música só, ou por outros que fazem escolhas erradas e não conseguem voltar para o mercado. É muito dinheiro, e eles não têm cabeça”, completou Rômulo. Quem soube colher os frutos diversifica os investimentos. Há anos nas paradas de sucesso, Jefferson Fernandes Luiz, o MC Sapão, deixou de lado os exageros e as lembranças da prisão — foi detido há mais de uma década por apologia ao crime. Hoje, só pensa no trabalho e na família. “Faço teatro, interpretação, canto e quero voltar para o Inglês. Me apresento para todo tipo de pessoa. Nunca me imaginei no Copacabana Palace e já cantei várias vezes lá”, revela Sapão, cria da Nova Brasília, no Complexo do Alemão. Não é só no funk que os desvios sepultam sonhos. No futebol, no meio artístico e na música em geral, as histórias se repetem. Para quem conseguiu voltar aos trilhos, ficam os ensinamentos. No caso de Márcio André da Silva Rosa, o Márcio G., que ficou conhecido ao lado de Goró, o recomeço foi mais doloroso. Em 2000, quando veio a falência após anos de sucesso, o autor de ‘A Distância’ e ‘Liberdade dos Funkeiros’ viu seu companheiro se suicidar: “O sucesso traz estas coisas. Não sei o que passou na cabeça dele. Tive dificuldades para voltar a cantar, mas hoje, com outra cabeça, estou conseguindo me firmar. O sucesso traz prazeres momentâneos, de pura ilusão”. Preso no final de 2010, acusado de apologia ao tráfico de drogas, Wallace Ferreira da Mota, o MC Smith, que cantava ‘proibidões’, retoma aos poucos a carreira com o hit ‘Vida Louca’, de Cazuza. Após o susto, o desejo de fazer sucesso longe de problemas falou mais alto para o morador do Complexo do Alemão: “Hoje não tem mais graça cantar proibidões. O funk fala mais de carros, mulheres e riqueza”. Já Mauricinho G., do Alô Som, que foi estofador quando o grupo de samba acabou, prefere manter trabalhos paralelos para não se decepcionar de novo. Há 8 meses na estrada, o grupo dos sucessos ‘Instinto Natural’ e ‘Que situação’ espera reconquistar a fama. “Não tínhamos controle. Senti falta do assédio e do carinho das pessoas”, assumiu o pandeirista do Alô Som, Maurício Ramos Júnior.
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