domingo, dezembro 11, 2011

Miséria até no quintal da República


A Presidência da República determinou a abertura de créditos especiais no valor de R$ 205,6 milhões para serem gastos neste ano com cinco programas do Plano Brasil Sem Miséria, mas somente pouco mais de R$ 1 milhão — 0,5% do total — foram efetivamente liberados para uma única ação governamental. A erradicação da pobreza extrema — são 16,2 milhões de brasileiros nessa condição social — até o fim de 2014 é o principal compromisso assumido pela presidente Dilma Rousseff e o mote de seu governo.

O plano foi elaborado a partir dos primeiros dias de governo e lançado em junho. Novos programas foram desenvolvidos e recursos extras incluídos no Orçamento da União já para 2011, os créditos especiais. Mas, ao fim do primeiro ano do mandato da presidente, o Brasil Sem Miséria não deslanchou. O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) justifica que os recursos "ainda estão na fase de empenho" (leia mais na página 3).

O Correio fez um levantamento dos programas que integram o Brasil Sem Miséria. São ações criadas especificamente para o plano ou remodeladas para atender o compromisso oficial de erradicação da miséria em quatro anos. Na visão do governo de Dilma, a pobreza extrema será eliminada por meio de iniciativas que vão além da transferência de renda — essa função é desempenhada pelo Bolsa Família.

Cinco ações complementares ao Bolsa Família têm condições financeiras de serem executadas desde setembro, quando a Presidência da República autorizou a abertura dos créditos especiais. É o caso de iniciativas de orientação profissional, fomento a atividades produtivas rurais e assistência técnica a trabalhadores, sob a responsabilidade do MDS; obras e equipamentos para oferta de água, cujo responsável é o Ministério da Integração Nacional; e pagamento do Bolsa Verde, atribuição do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

As despesas de governo disponíveis no Portal da Transparência, mantido pela Controladoria-Geral da União (CGU), mostram que somente a ação tocada pelo MMA começou a sair do papel. O Bolsa Verde é um benefício de R$ 300, destinado a famílias em situação de extrema pobreza que contribuem para a conservação ambiental. O foco principal são os trabalhadores rurais que vivem em assentamentos. Até agora, já foram gastos R$ 1.073.100,00, o equivalente a 3.577 benefícios. O crédito especial autorizado pela Presidência da República é de R$ 10 milhões, suficiente para atender 18 mil famílias. Não há registro de despesas pelos ministérios para as outras quatro ações.

Água
O Correio confirmou a informação no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), programa do governo federal que registra todos os pagamentos da União. Uma consulta feita no Siafi pela assessoria técnica do deputado federal José Antônio Reguffe (PDT-DF), a pedido da reportagem, mostra a mesma realidade: o único registro de despesa é com o Bolsa Verde, no valor pouco superior a R$ 1 milhão.

Todas as ações com crédito especial ganharam a rubrica "Plano Brasil Sem Miséria". O maior montante, R$ 161 milhões, foi direcionado ao programa que busca ampliar a oferta de água para famílias extremamente pobres, tanto para consumo quanto para produção de alimentos. Não houve nenhum gasto com a ação, conforme registros do Portal da Transparência e do Siafi.

No último mês de setembro, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) — entidade ligada diretamente à Presidência, responsável por assessorá-la na formação de políticas na área — recomendou que o MDS aditivasse a parceria existente com a Associação Programa Um Milhão de Cisternas (AP1MC). A organização é parceira do MDS na construção de cisternas no semiárido nordestino e foi incluída no Brasil Sem Miséria.

Um dos dois termos de parceria com a AP1MC foi prorrogado em outubro, no valor de R$ 80 milhões, para a construção de mais 8 mil cisternas para a produção de alimentos. O aditivo expirou em 30 de novembro. A parceria, porém, foi com o MDS, e não com o Ministério da Integração Nacional, responsável pela ação de "implantação de obras e equipamentos para oferta de água". Foi esse programa que recebeu um crédito especial de R$ 161 milhões. A AP1MC aparece na lista das 15 entidades sem fins lucrativos que mais receberam dinheiro da União em 2010. Foram repassados R$ 96,7 milhões à organização no ano passado.

À míngua
Desde a publicação do decreto presidencial que implantou o plano, em 3 de junho, o Brasil Sem Miséria já incluiu mais cinco programas de governo destinados à erradicação da pobreza extrema, além das ações para as quais já houve liberação de dinheiro. São os casos das iniciativas de universalização do acesso à água, produção de próteses dentárias para pessoas extremamente pobres, ações de qualificação e formação profissional de mulheres. Não houve liberação de crédito para esses programas nem registro de qualquer despesa.

Outros programas integrados ao Brasil Sem Miséria tiveram uma execução orçamentária baixa ao longo do ano. É o caso do apoio às comunidades tradicionais, com gastos de R$ 2 milhões dos R$ 12,7 milhões orçados, e do programa de acesso à alimentação, que consumiu R$ 473 milhões dos R$ 883,2 milhões previstos.

O resultado mais expressivo do Brasil Sem Miséria, até agora, foi a ampliação de pessoas atendidas pelo Bolsa Família. A própria presidente Dilma já destacou como principal ação do plano a inclusão de 1,3 milhão de crianças no Bolsa Família, o que foi possível após a ampliação do limite de três para cinco filhos. Além disso, nos primeiros cinco meses do plano, 180 mil novas famílias passaram a receber o benefício.

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