Novo golpe em aposentados frauda o crédito consignado
Num país com número cada vez maior de idosos, uma nova fraude, que tem aposentados e pensionistas como principal alvo, se espalha pelo Brasil: o golpe do empréstimo consignado. Pequenas financeiras, muitas vezes disfarçadas de agências do INSS, se multiplicam com a promessa de democratizar o crédito fácil, sem consulta ao SPC ou avalista. Os beneficiários são convencidos a contrair um empréstimo com desconto em folha - mas o primeiro, verdadeiro, abre caminho para outros feitos à revelia do titular. Em Pernambuco, a Defensoria Pública localizou em nome de quem foram contraídos 17 empréstimos, sem que ele visse o dinheiro. No Rio, a defensoria ajuizou ações de ressarcimento em nome de uma aposentada que foi descontada de empréstimos que nunca requisitou. Só este ano foram firmados no país contratos de empréstimos consignados que somam R$ 11,4 bilhões.
Presidente da comissão de juristas que preparou o anteprojeto de atualização do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), Benjamin se refere aos aposentados e pensionistas mais pobres, vítimas preferenciais dos golpistas e do próprio sistema de crédito, que não informa os riscos do empréstimo. Para estancar a sangria, a comissão está propondo o veto à prática de atos de assédio ao consumidor de crédito, especialmente o idoso, o doente ou em estado de vulnerabilidade agravado, e um limite de endividamento pessoal fixado em 30% da remuneração mensal líquida, chamado de "mínimo existencial".
- O crédito consignado é uma bomba-relógio, uma perversão da democracia. É como medicamento. Se a pessoa não tem condições de entender a bula, não tem também condições de identificar os perigos do contrato de crédito - disse Benjamin.
Por lei, a concessão de empréstimos à revelia do favorecido é caso de polícia. Por causa disso, o INSS mantém, desde março, um posto avançado na Delegacia de Polícia de Proteção ao Idoso de Teresina, que atua em todo o Piauí e suspende o desconto das parcelas dos empréstimos consignados quando o aposentado prejudicado registra o caso em boletim de ocorrência. Mas a investigação é difícil, desarticulada e raramente chega à autoria do crime.
Como as operações de empréstimo consignado são fechadas por agentes credenciados pelas instituições financeiras (os correspondentes bancários ou "pastinhas", como são popularmente conhecidos), eles encabeçam a lista de suspeitos do golpe. Isso não significa que sejam os únicos. De acordo com o INSS, um dos casos mais comuns é a chamada fraude familiar, quando um filho ou parente se vale da boa-fé do aposentado e falsifica documentos, ou até mesmo mente para que o idoso assine um papel dando à pessoa a autorização para fazer empréstimos em seu nome.
O golpe do superendividamento não prospera apenas nas camadas mais pobres da população. A aposentada carioca Sônia Regina Canha Rosa, de 53 anos, tomou um susto quando recebeu apenas R$ 700 da aposentadoria mensal de R$ 6,2 mil. Ao cobrar explicações do INSS, descobriu que incidiam sobre o benefício as parcelas correspondentes a dois empréstimos consignados que alegou nunca ter pedido:
- Quero meu dinheiro de volta.
Sônia disse que, há meses, o seu nome tem sido usado em vários tipos de golpes, entre os quais a compra de equipamentos eletrônicos e a instalação de linhas telefônicas. Ela acredita que os dois empréstimos consignados estão nesse contexto. Com o apoio da Defensoria Pública, a aposentada ajuizou ações de ressarcimento, mas só conseguiu a devolução do dinheiro de um dos bancos, ainda assim sem juros:
- O que mais me impressiona é a quantidade de pistas deixadas pelos golpistas. Mas ninguém, dos lojistas aos funcionários dos bancos, fez nada para esclarecer.
O presidente do Sindicato Rural de Coroatá, Antônio Viana, disse que o golpe não perdoa nem o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que assegura transferência de um salário mínimo a pessoas com mais de 65 anos e que não pode ser usado para empréstimos consignados. Viana disse que, para burlar o veto, o "pastinha" abre uma nova conta bancária em nome do beneficiário, para onde o dinheiro é transferido sistematicamente. Como é conta comum, está livre para aceitar as consignações. Em Coroatá, pedidos de indenização já são 80% das 3.700 ações em andamento na vara especializada.
Na tentativa de reduzir o número de fraudes, o INSS determinou que não sejam mais efetuados empréstimos de um mesmo segurado em estados diferentes. Antes, uma mesma pessoa podia fazer empréstimos em cidades diferentes, o que fez com que muitos golpistas aproveitassem para conseguir, com documentos falsos, a liberação de empréstimos em cidades diferentes da que a vítima residia. Ou seja, demorava muito para que o aposentado tomasse conhecimento e pudesse saber de onde veio a fraude.
Para o ministro Herman Benjamin, o que foi feito até agora não resolve. Ele disse que, entre as medidas cobradas, é preciso analisar "certa promiscuidade" entre o empregador público e as instituições credenciadas para operar o crédito consignado:
- O crédito não é algo que se deva oferecer, mas, sim, buscar. Não sou contra. É um instrumento de distribuição social dos benefícios da sociedade de consumo. Porém, se não houver providências das autoridades, o crédito terá efeitos catastróficos na vida de milhões de brasileiros sem condições de pagar dívidas sem fim.
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