
São fantásticas as surpresas que a vida apresenta, e como em semanas se é capaz de produzir um cenário geopolítico global pautado pela Vanguarda e pelo ineditismo. Antes de abordar a atuação tão complexa quanto carismática do papa Francisco, é preciso fazer uma reflexão profunda a respeito da atuação de seu antecessor Joseph Ratzinger. Nascido Joseph Aloisius Ratzinger, o cardeal católico que integra a seleção de teólogos que mais influenciaram os rumos da igreja católica se tornou papa em 19 de abril de 2005, passando a se chamar Bento XVI. Quem analisa de forma profunda a influencia do teólogo Ratzinger na igreja é capaz de observar que o homem que é membro de academias cientificas europeias como a academie dês sciences morales et politiques brilhou muito mais como teólogo que como papa. Introspectivo, absorto no desenvolvimento de novas teorias e incapaz de imprimir continuidade ao estilo carismático de João Paulo II, Ratzinger, que assumiu o trono de São Pedro como um conservador, deixou o pontificado como um revolucionário. O ineditismo da renúncia de um papa foi uma ação corajosa que pulverizou a ideia disseminada por séculos de que o líder da igreja teria a obrigatoriedade de exercer o cargo até o fim da vida. Ao carbonizar séculos de inércia e imobilismo, Joseph Ratzinger expos ao mundo a anatomia de uma tragédia instalada no vaticano que tornou a igreja refém de escândalos de corrupção, escândalos financeiros e sexuais, incluindo centenas de denúncias de pedofilia ao redor do planeta. Com suas vísceras expostas, restou a igreja realizar um conclave pautado pelo reformismo e pela consciência de que não é mais possível pautar suas ações para atender de forma exclusiva as principais necessidades do continente europeu. A igreja precisa estar em sintonia com a sociedade, integrar o processo de globalização e contribuir para a redefinição do cenário geopolítico. A escolha de Jorge Mario Bergoglio simbolizou o momento reformista e inovador que a igreja passou a vivenciar. Ao escolher Francisco como seu novo nome, o novo líder dos católicos emitiu sinais de uma igreja preocupada com os pobres e em sintonia com os anseios da sociedade global. Francisco, tão ou mais carismático que João Paulo segundo, é o primeiro papa não europeu da história, mas talvez seja o primeiro papa que consegue agir em sintonia com o discurso que prega. Renunciando ao luxo e saudando os irmãos sempre com ósculo santo, o papa demonstra que a fraternidade suplanta a disputa delirante de poder que corroeu as estruturas do vaticano nas últimas décadas. A história se encarregará de medir seu grau de influencia política, mas a julgar pelo impacto político e social gerado nas primeiras semanas de seu pontificado, é possível prever que o primeiro e único papa Francisco da História desenhará ações que devem repaginar a própria história e reconstruir a imagem da igreja no planeta.
Chico Andrade é geógrafo, escritor, professor e cientista político.
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