Margarida Pressburger, ativista, membro do Subcomitê de Prevenção à Tortura da ONU, ex-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ e da OEA vê retrocesso no país. "Sou uma ativista dos Direitos Humanos. Hoje estou nas Nações Unidas, mas já passei por outros lugares, sempre atuando no mesmo sentido, fazendo o que sei e o que posso para que se cumpra a Declaração dos Direitos do Homem. Luto por igualdade. Essa é a minha bandeira. E a do Botafogo também". • Conte algo que não sei. Amo minha pátria e tenho muito orgulho de ser brasileira. Mas o Brasil nunca foi tão homofóbico, racista e machista quanto está sendo agora. Falo a partir de números e do nosso Congresso, de onde está vindo esse ódio que está contaminando toda a nação. Por outro lado, tenho uma esperança muito grande. Estou vendo cada vez mais jovens entrando na luta do ativismo. • Fale desse ódio que a senhora identifica no Congresso. Há uma parede fundamentalista, um bloqueio, um paredão. Tudo é proibido, tudo é pecado, crime. Isso vai incitando a derrubada das raízes afro-brasileiras, dos centros. Contamina tudo. A Liga das Escolas de Samba está pensando em desobrigar a Ala das Baianas, porque a maioria dessas senhoras está na igreja, não pode mais sair no carnaval. É uma lavagem cerebral pelo ódio, não pelo amor.
A homofobia está implantada no Congresso com alta propaganda. Tem uma coisa que me assustou muito nessas eleições. Quase meio milhão de pessoas elegeram Jair Bolsonaro. Vejo o Clube Militar voltando a se movimentar. Aquela passeata recente em São Paulo pedindo a volta da ditadura... Isso me assusta.
• Como começou sua trajetória nos Direitos Humanos?
Entrei para a faculdade em março de 1964 e me formei em dezembro de 1968. Cheguei com a ditadura e parti com o AI-5. Não tive formatura. Assim começou meu ativismo. Tive um irmão preso e torturado. Na Faculdade de Direito, todos os dias o Exército cercava o prédio. Tive amigos mortos. Depois, a ditadura se abrandou, mudou, e até hoje nós não temos o cumprimento da Declaração dos Direitos do Homem. Luto por isso.
• Quais as grandes questões dos Direitos Humanos no Brasil?
Temos um descumprimento generalizado. A homofobia, a violência contra a mulher, em duas modalidades: a doméstica, coberta pela Lei Maria da Penha. A outra é um novo tipo do direito que está surgindo, o feminicídio, ou seja, o assassinato da mulher pelo fato de ser mulher. A desmilitarização das polícias, incluo aí os bombeiros, é uma questão central para se pensar os Direitos Humanos no Brasil.
• Porquê?
Está sendo aplicada às polícias militares a mesma cartilha das ditaduras. E há a corrupção. Teria que se acabar com a Polícia Militar e começar tudo de novo. Li no GLOBO sobre soldados que ganham R$ 2 mil e têm carros de R$ 100 mil.
• E a Comissão da Verdade?
Somos o único país latino-americano vindo de uma dita dura que não puniu seus torturadores. E não se fala do outro lado. O outro lado foi executado sem direito a defesa. Os mortos, desaparecidos e torturados não tiveram direito à defesa. Não teve outro lado, teve um lado: o do massacre. Massacraram aqueles que pensavam de forma diferente, sendo que a maioria muito jovem, na idade do ideal, do sonho.
• O que isto provocou, além do sofrimento físico e da perda de vidas humanas?
Mataram o sonho dos jovens à força dos tanques. Não acho justo torturadores aposentados receberem seus soldos. Não há crime de tortura prescritível. O Brasil assina vários pactos entre as Nações Unidas e em todos eles a tortura é tida como crime imprescritível. Não falo em prender sumariamente todos os coronéis da época. Falo em julgamento mesmo. Provas. Com amplo direito de defesa.
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